--Não, nunca ouvi.
--Pois, meu rapaz, ahi é que Salomão verdadeiramente tinha as suas minas, as suas minas de diamantes!
--Como se sabe?
--Como se sabe!? Tem graça! Sabe-se perfeitamente. O que é Suliman senão uma corrupção de Salomão? O nome das serras, realmente, sempre foi serras de Salomão. Além d’isso, uma feiticeira do districto de Manica, uma velha de mais de cem annos, contou-me tudo... Isto é, contou-me que para lá das serras vive um povo que é da raça dos Zulús, e falla um dialecto zulú: mas como força, e corpulencia, e coragem, vale mais que os Zulús. Pois n’esse povo ha videntes, grandes feiticeiros, que de geração em geração têm trazido o segredo d’uma mina prodigiosa, que foi d’um rei branco, muito antigo, e que ainda hoje está cheia de pedras brancas que reluzem... De sorte que não ha duvida nenhuma.
Para mim havia toda a duvida. As minas d’Ophir interessavam-me, como da nossa crença e da Biblia: mas das minas de pedras brancas que reluzem, conhecidas em segredo por feiticeiros zulús, teria certamente rido se não fôra o respeito devido a um caçador tão digno como Evans. De madrugada Evans partiu, a acabar tristemente nas pontas d’um bufalo. E não pensei mais em Salomão, nem nas suas minas de diamantes.
Aqui ha vinte annos porém, n’um encontro muito singular que tive no districto de Manica, de novo ouvi fallar das minas de Salomão, e d’um modo que para sempre me devia impressionar. Era n’um sitio chamado a «aringa de Sitanda». Não ha peor em toda a Africa. Fructa nenhuma, caça nenhuma, tudo sêcco, tudo triste--e os pretos vendem os ossos d’um frango por fazenda que vale uma vacca.
Apanhei lá um ataque de febre, e estava fraquissimo, enfastiadissimo, quando me appareceu um dia um portuguez de Lourenço Marques, acompanhado por um serviçal mestiço. Entre os portuguezes de Lourenço Marques--ha soffrivel e ha pessimo. Mas este era dos melhores que eu vira--um homem muito alto e muito magro, de bellos olhos negros, os bigodes já grisalhos todos retorcidos, e umas maneiras graves que me fizeram pensar nos velhos fidalgos portuguezes que aqui vieram ha seculos e de que tanto se lê nas historias. Conversámos bastante n’essa noite, porque elle fallava um bocado de mau inglez, eu um bocado de mau portuguez; e soube que se chamava José Silveira, e que possuia uma fazenda ao pé da cidade, em Lourenço Marques.
Na manhã seguinte, cedo, antes de partir com o mestiço acordou-me para se despedir, de chapéo na mão, cortez e grave como os antigos, os que tinham Dom.
--Até mais vêr, camarada!
--Boa viagem! Até mais vêr!
O homem conservava, pregados em mim, os grandes olhos negros que rebrilhavam. Depois accrescentou muito sério: