"Papa?"
"O papai está trabalhando, Guile"
"Po quê?"
"Porque gente grande precisa trabalhar"
"Po quê?"
"Porque senão não dá para comprar comida, nem roupa, nem nada"
"Po quê?"
"Porque o mundo está organizado assim, Guile"
"Po quê?"
"Um ano e meio, e já é candidato às bombas de gás lacrimogênio".
Os desenhos que ilustram a história acima são até dispensáveis para mostrar como continua atual o universo que rodeia Mafalda, clássica personagem de Quino e que nesta segunda-feira (29) completa 50 anos. A garotinha de cabelos negros ornados por uma fita e rosto gorducho ficou conhecida por causa de suas contestações e inconformismo com o mundo que lhe serviu de palco durante 1964 e 1973.
Filha de pais de classe média, Mafalda nunca se limitou a problemas típicos da infância e levou o olhar crítico e apurado para questões econômicas e sociais de todo o planeta. Demonstrava ojeriza às desigualdades, às injustiças e à violência da mesma forma que repudiava um prato de sopa. Na direção oposta, colocava Beatles no mais alto dos patamares.
"Mafalda é uma heroína 'enraivecida' que recusa o mundo tal qual ele é. (...) Já que nossos filhos vão se tornar --por escolha nossa-- outras tantas Mafaldas, será prudente tratarmos Mafalda com o respeito que merece um personagem real", cunhou o escritor Umberto Eco em "Mafalda ou A Recusa", texto publicado em 1969 e que ajudou a torná-la famosa mundialmente.
Em sua cidade natal, Buenos Aires, Mafalda virou praça e estátua, uma das atrações preferidas de muitos turistas para as fotos. Mas ela representa muito mais que isso: apesar de ter vivido somente nos desenhos e tirinhas --e uma brevíssima incursão pelo desenho animado--, tornou-se uma referência de seu país, uma das dez figuras argentinas mais conhecidas em todo o mundo no século 20.